A Esperança dá sentido à realidade presente
Jackson Erpen - Cidade do Vaticano
No livro Fé, esperança e caridade – as três graças do Cristianismo, o cardeal Raniero Cantalamessa, apresenta uma reflexão profunda sobre as três virtudes teologais, fundamentais à vida cristã. Com linguagem acessível e espiritualidade enraizada na tradição bíblica e patrística, Cantalamessa mostra como a fé orienta o relacionamento com Deus, a esperança sustenta o crente nas provações e a caridade traduz o amor divino em ação concreta. A obra convida à vivência autêntica do Evangelho, destacando essas virtudes como caminhos para a santidade e a transformação pessoal.
Inspirado nesta obra, Pe. Gerson Schmidt* nos propõe hoje a reflexão "A Esperança dá sentido à realidade presente":
"Novo livro do cardeal Raneiro Cantalamessa, ex-pregador da Casa Pontifícia, intitulado “Fé, esperança e caridade – as três graças do Cristianismo”, foi editado no Brasil pela editora Paulus. Aborda, num segundo grande capítulo, a virtude da esperança, tema no Ano Santo Jubilar, que nos é propício aprofundar.
Jesus em sua pregação proclamou a esperança da Vida Eterna, afirmando vigorosamente a ressurreição dos mortos. Diante da controvérsia dos saduceus, colocando a Jesus um caso hipotético de um homem que teria sete mulheres e todas morreram, qual delas o teriam na eternidade como marido. Jesus responde que na eternidade seremos como anjos e proclama o Deus de Abraão, de Isaac e de Jacó e conclui que “Deus não é Deus dos mortos, mas dos vivos, porque para Deus todos vivem”. Cristo não só ressuscita a filha de Jairo, o filho da mulher de Naim, e Lázaro. A prova irrefutável que Ele é Senhor dos vivos é que Ele mesmo ressuscita. Por isso, nossa esperança não é só para esta vida, mas para a que virá depois de nossa morte.
Crer na Vida Eterna muda nossa existência e vida cotidiana. É preciso voltar à nossa realidade presente, quando afirmamos crer na Vida Eterna. Voltemos ao hoje de nossa vida, ao exercício da virtude teologal da esperança que é aquilo que mais nos interessa. É tempo de, sobre este ponto, a passagem do antigo ao Novo testamento, ocorrida historicamente a dois mil anos, ocorrer existencialmente hoje em cada um de nós mostrando que a revelação da vida eterna também muda a vida de um crente aqui na terra.
Cantalamessa conta nesse livro que um ateu contou uma experiência pessoal. ”Assistia, por dever de representação a um funeral cristão. A certa altura, o oficiante pronunciou, em tom solene, essas palavras: "esse irmão ressuscitará; todos nós um dia ressuscitaremos". Ele olhou em volta: nenhum dos presentes pestanejou ou deu sinal de alguma emoção. Disse para si: "se eu pudesse acreditar no que essa gente diz acreditar, penso que começaria a dar saltos de alegria e a gritar: Urrá! Urrá! Não digo que se possa sempre dar saltos de alegria (estamos na fé, não na visão), mas deveria ser possível perceber que a fé na vida eterna muda algo em nossa vida, nós que acreditamos: em nossas palavras, em nosso próprio olhar. O apóstolo Pedro sugere duas coisas com as quais dar razão da esperança: doçura e respeito (1Pd 3,15-16). Aquele para quem a vida eterna é algo mais do que uma simples crença, diante de qualquer dificuldade contradição, repete para si com São Bernardo e Santo Inácio de Loyola: “Quid hoc ad aeternitatem? (o que é isso diante da eternidade?)” .
Se perguntamos o que é a esperança, se a tua mente por ela é adornada e de onde ela vem, na da mais pura escolástica, poderia se responder assim: “Esperança é uma espera certa da glória futura, a qual produz Graça Divina e mérito precedente”.
As virtudes teologais são tratadas por dois grandes poetas: Dante Alighieri e Charles Péguy. No discurso de Peguy sobre as virtudes teologais, se parte de um exame. O interrogatório não se realiza no céu, mas na terra. O examinador não é um apóstolo, mas um pobre pároco de aldeia. O examinado é um criança, talvez da catequese da confirmação. Primeiramente o simples sacerdote pergunta: Quais as três virtudes teologais? A criança responde: fé, esperança e caridade. O Pároco humilde pergunta: porque são chamadas de virtudes teologais? A criança responde: Porque essas três virtudes se referem diretamente a Deus! E o sacerdote pergunta: “O que é a esperança?”. O catequizando responde: “A esperança é uma virtude sobrenatural pelo qual esperamos de Deus, com confiança, a sua graça nesse mundo e a glória eterna no outro”.
A esperança não é apenas uma meta futura, mas um motor propulsor no presente, que transforma nosso modo de viver e proceder. Quem não pensa no amanhã, não vive bem no dia de hoje. Quem não coloca seu coração na eternidade, não valoriza o tempo presente. Vive de qualquer jeito, deixa as coisas como estão, sem compromisso de eternidade.
Cantalamessa escreve assim: “Fé, a esperança e caridade são três irmãs que caminham de mãos dadas: as duas grandes ladeando a menina no centro. E todos sabem bem quem é a menina. Todos, ao vê-las, pensam que são as duas maiores que puxam a pequena pela mão. Estão equivocados! É ela, a pequena, que puxa tudo. Se a esperança parar, tudo para! Não creio que restam muitas dúvidas sobre qual das três virtudes teologais o poeta ama mais. A verdadeira grande tentação para ele é contra a esperança, concordando nisso com a teologia clássica que considera “o desespero o pecado mais grave de todos”, segundo afirma São Tomás de Aquino, na Suma Teológica".
*Padre Gerson Schmidt foi ordenado em 2 de janeiro de 1993, em Estrela (RS). Além da Filosofia e Teologia, também é graduado em Jornalismo e é Mestre em Comunicação pela FAMECOS/PUCRS.
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