O ã “preventivo”
Andrea Tornielli
“O verdadeiro perdão não espera pelo arrependimento, mas oferece-se primeiro, como um dom gratuito, antes mesmo de ser aceito”. Com essas palavras, Leão XIV comentou o trecho do Evangelho de João que descreve Jesus enquanto oferece o pão também ao traidor Judas. É a lógica divina, tão distante daquela humana do do ut des. Jesus, explicou o Papa, não ignora o que acontece, mas justamente porque vê com clareza, sabe que “a liberdade dos outros, mesmo quando perdidos no mal, pode ainda ser alcançada pela luz de um gesto bondoso”. É o escândalo do perdão “preventivo”, que antecipa, com a oferta do abraço da misericórdia, sem exigir nenhuma condição prévia. Assim como aconteceu com o publicano Zaqueu, que se arrependeu porque foi chamado e acolhido por Jesus, que se auto-convidou para sua casa, para grande consternação de todos diante do gesto de ruptura das tradições e convenções realizado pelo Nazareno.
Quanto nossas vidas e nossos relacionamentos precisam desse perdão. Quanto nosso mundo precisa desse perdão, que “não é esquecimento, não é fraqueza”. Vêm à mente as palavras proféticas da , que João Paulo II publicou pouco depois dos ataques terroristas de 11 de setembro nos Estados Unidos. Enquanto todos pensavam na guerra “preventiva”, na onda da enormidade do ataque sofrido, o Pontífice quis dizer que “não há paz sem justiça, não há justiça sem perdão”. “Muitas vezes – afirmava o Papa Wojtyla –me detive a refletir nesta questão: qual é o caminho que leva ao pleno restabelecimento da ordem moral e social tão barbaramente violada? A convicção a que cheguei, raciocinando e confrontando com a Revelação bíblica, é que não se restabelece cabalmente a ordem violada, senão conjugando mutuamente justiça e perdão. As colunas da verdadeira paz são a justiça e aquela forma particular de amor que é o perdão”. Não apenas as pessoas individualmente, mas também “as famílias, os grupos, os Estados, a própria Comunidade Internacional, necessitam se abrir ao perdão para restaurar os laços interrompidos, superar situações estéreis de mútua condenação, vencer a tentação de excluir os outros, negando-lhes a possibilidade de apelo. A capacidade de perdão está na base de cada projeto de uma sociedade futura mais justa e solidária”.
O perdão não concedido, por outro lado, explicava ainda João Paulo II, “especialmente quando alimenta o prolongamento de conflitos, supõe custos enormes para o desenvolvimento dos povos. Os recursos são destinados para manter a corrida aos armamentos, as despesas de guerra, as consequências das represálias econômicas. Acabam assim por faltar os recursos financeiros necessários para gerar desenvolvimento, paz e justiça. Quantos sofrimentos padece a humanidade por não saber reconciliar-se, e quantos atrasos por não saber perdoar! A paz é a condição do desenvolvimento, mas uma verdadeira paz torna-se possível somente com o perdão”.
Papa Leão concluiu a audiência explicando que “sem o perdão nunca haverá paz!”. E nos convidou para um dia de oração e jejum pela paz na sexta-feira, 22 de agosto, para implorar a intercessão de Maria Rainha da Paz, e para pedir a Deus paz e justiça para o mundo flagelado pelas guerras. Pelo nosso mundo, que tanto precisa do perdão “preventivo”.
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