A Esperança na Páscoa de Cristo Vivo
Jackson Erpen - Cidade do Vaticano
Santo Ambrósio de Milão e Santo Agostinho de Hipona interpretaram a Páscoa como um transitus ad Deum. Agostinho afirmava: «A verdadeira Páscoa não é apenas uma celebração anual, mas um movimento interior, um desejo de Deus, uma transcendência do tempo».
Na homilia da Missa da Vigília Pascal - lida pelo cardeal Giovanni Battista Re - o Papa Francisco recordava as palavras do grande teólogo Henri de Lubac: "«Bastar-nos-á compreender isto: o cristianismo é Cristo. Verdadeiramente, não há nada mais do que isso. Em Cristo temos tudo». E este “tudo”, que é Cristo ressuscitado, abre a nossa vida à esperança. Ele está vivo e ainda hoje quer renovar a nossa vida".
Neste contexto, Pe. Gerson Schmidt* nos propõe hoje a reflexão "A Esperança na Páscoa de Cristo Vivo":
Para a fé Cristã, a nova vida começou já na ressurreição de Cristo. As primeiras palavras de nosso novo Papa Leão XIV saem da boca de Cristo Ressuscitado: “A paz esteja convosco”. A vida nova consiste na liberdade perante si mesmo e os poderes do mundo, no amor e na alegria. Esta alegria, porém, não se orienta para um estado simplesmente futuro, mas é prêmio e graça de Deus, já aqui e agora. Apenas esse caminho conduz à Ressurreição, no qual o mundo se torna diferente – o caminho pela cruz. Amor e cruz pertencem um ao outro. Não por uma mística de sofrimento ou masoquismo, mas em razão da experiência pascal de Cristo. Um amor sem sofrimento seria uma brincadeira, acabaria por extinguir-se. Sofrer não é mera passividade e conformidade. O sofrimento é sensibilidade com o outro. Por causa do amor, a cruz é inevitável. Cristo não morreu acidentalmente, mas por causa de uma sociedade que se recusou a transformar-se e redimir-se. “Não há outra verdade, além do amor, na qual respiramos, nos alegremos, trabalhemos, na qual nós choremos e esperemos”109.
A Igreja como sinal escatológico é mais claramente percebida quando toma consciência da sua missão, que consiste de modo geral em mostrar que tudo possui um acabamento em Cristo, e ao mesmo tempo levar as pessoas ao seguimento de Jesus. Neste sentido, é no seio da Igreja que devemos sentir primeiro os sinais do Reino; ela deve transparecer essa presença de Cristo ressuscitado tanto nas suas ações hierárquicas e sacramentais quanto na atividade pastoral110. Na primeira homilia do novo Papa Leão ouvimos que a Igreja “seja cada vez mais uma cidade situada sobre um monte (cf. Ap. 21,10), arca da salvação que navega pelas ondas da história, farol que ilumina as noites do mundo, isso não se deve tanto à magnificência das suas estruturas ou à grandeza de seus edifícios, mas como pela santidade dos seus membros, de que povo que Deus adquiriu para si”.
Assim, para o Concilio Vaticano II urge à Igreja envolver-se no mundo, a fim de que sua pregação e mensagem atinjam mais eficazmente as pessoas. Porque na perspectiva da fé os cristãos carregam as aspirações de um mundo melhor e a busca do sentido último de toda humanidade. Em outras palavras, “a Igreja sabe perfeitamente que, ao defender a dignidade da vocação do homem, restituindo a esperança àqueles que já desesperam do seu destino sublime, a sua mensagem está de acordo com os desejos mais profundos do coração humano. Longe de diminuir no homem, a sua mensagem contribui para o seu bem, difundindo luz, vida e liberdade; e fora dela, nada pode satisfazer o coração humano”111. Assim, o Reino definitivo nós “já” sentimos nas relações fraternas, pois o céu começa em cada um que promove a vida. O desfecho final “ainda não” chegou, mas temos a firme esperança de que na hora certa chegará e, então, seremos uma só nação de muitos povos, raças e línguas, louvando e bendizendo a Deus junto com o coro dos anjos e dos santos.
O acontecimento escatológico, onde ancoramos nossa esperança, é um acontecimento adentro da História. Diz Bultmann: “o sentido da História, reside no momento presente. Quem quer que se queixe: Não me é possível ver qualquer sentido da História; por isso, a minha vida, que está impregnada na História, é sem sentido, a esse tem de se advertir: Não olhes à tua volta, para a história Universal; cabe-te considerar primeiro a tua história pessoal. É sempre no teu presente que reside a História, e tu não pode vê-la como espectador, mas somente inserido nela pela tua decisão responsável. Em cada instante dormita a possibilidade de ser o instante escatológico. És tu que a tens de despertar”112. Nossa História está prenhe, grávida de eternidade. Devemos gestar o eterno em nosso meio, abrindo-nos à graça do alto.
O futuro escatológico já existe em Cristo Vitorioso e pode ser captado na fé. A fé abre novos horizontes e desperta a esperança cristã no futuro. Por outro lado, essa esperança não é simplesmente ânsia e expectativa, como acontecimento na expectativa de caráter da primitiva cristandade. Mas é a força que determina e dá asas à atividade do cristão, em ordem ao Reino de Deus que vem em poder e glória. Precisamente porque o fim já presente é sempre um novo acontecimento da atuação salvífica de Deus em Cristo, no sentido vertical como imersão na história, tem, o cristão de inserir-se, pela sua ação, na história da salvação, no sentido horizontal, contribuindo para que o obra salvífica aconteça. Não simplesmente numa atuação para uma salvação pessoal, de forma egoísta, como no antigo axioma “salva a tua alma”. Mas numa redenção universal de transformação e redenção de tudo pela Páscoa transformadora de Cristo."
*Padre Gerson Schmidt foi ordenado em 2 de janeiro de 1993, em Estrela (RS). Além da Filosofia e Teologia, também é graduado em Jornalismo e é Mestre em Comunicação pela FAMECOS/PUCRS.
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[1] WULF, Friedrich. Concilium, Revista Internacional de Teologia, Lisboa, , número 60, Abril-junho de 1968, p.93.
[2] Cf. LG, 48; BOFF, L. Vida para além da morte. op. cit., pp. 20-30.
[3] GS, 21.
[4] BULTMANN, R. Gestchiste und Eschatologie, Tubinga, 2ª Ed., 1964, p.184.
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