Francisco e o ecumenismo: um ¡°caminho irrevers¨ªvel¡±
Alessandro Di Bussolo ¨C Cidade do Vaticano
Na noite de 13 de março de 2013, dia da sua eleição o Papa Francisco falou pela primeira vez ao mundo, da sacada das Bênçãos e se definiu ¡°bispo de Roma, antes de Papa, pastor de uma Igreja, a de Roma, ¡°que preside na caridade todas as Igrejas¡±. São palavras de grande sensibilidade ecumênica, amadurecida pelo cardeal Jorge Mario Bergoglio em terras argentinas. São palavras de quem sabe que as modalidades com as quais é recebido o primado petrino são os maiores obstáculos no caminho para a unidade dos cristãos. Isso já tinha sido sublinhado por São João Paulo II na encíclica ¡°Ut unum sint¡±, 25 anos atrás.
A continuidade com os predecessores, a linha do Concílio
Desde então Francisco, numa sucessão de gestos, encontros, discursos e declarações comuns com homens e mulheres de diferentes Igrejas, tem mostrado que a construção da unidade visível da Igreja de Cristo é uma das prioridades do seu pontificado. Isto explica seu compromisso para superar as divisões e fortalecer a comunhão, com o objetivo de tornar cada vez mais eficaz a missão do anúncio e do testemunho da palavra de Deus. Sua escolha de colocar entre as prioridades da Igreja Católica a participação plena e ativa no caminho ecumênico está em profunda continuidade com seus predecessores, a começar por São João XXIII, na linha da transmissão do Concílio Vaticano II.
Francisco e Bartolomeu como Paulo VI e Atenágoras
Uma semana depois do conclave que o elegeu, Francisco abraçou Bartolomeu I chamando-o de ¡°Andr顱 como herdeiro do apóstolo. O Papa repetiu o gesto de Paulo VI com o Patriarca de Constantinopla Atenágoras em Jerusalém, quando em 5 de janeiro de 1964, Atenágoras chamou Paulo VI de ¡°Pedro¡±. E anunciou aos representantes das Igrejas cristãs e outras religiões, "a firme vontade de continuar no caminho do diálogo ecumênico", na esteira dos seus antecessores. Mais tarde encontrou-se com Bartolomeu em Jerusalém, em Roma e Istambul.
Abençoado por Bartolomeu
Em 29 de novembro de 2014, na Igreja Patriarcal de São Jorge em Istambul, no final da oração ecumênica, o Papa Francisco inclina-se diante do Patriarca, pedindo para ser abençoado por ele. No dia seguinte, durante a Divina liturgia ortodoxa, o Papa diz as seguintes palavras seu convidado:
Encontrar-nos, olhar o rosto um do outro, trocar o abraço de paz, rezar um pelo outro são dimensões essenciais do caminho para o restabelecimento da plena comunhão para a qual tendemos.
Evangelii gaudium: a diversidade reconciliada no Espírito
Papa Francisco esclarece esta urgência no compromisso ecumênico, ao dedicar alguns parágrafos na Exortação Apostólica ¡°Evangelii gaudium¡±, de 23 de novembro de 2013, um autêntico programa do seu pontificado. Um compromisso que, escreve no parágrafo 244, corresponde à oração de Jesus que pedindo ¡°que todos sejam um só¡±: peregrinemos juntos e para isso, devemos ¡°abrir o coração ao companheiro de estrada sem desconfianças procurando a paz no rosto do único Deus¡±. No parágrafo 230 explica que ¡°a unidade do Espírito harmoniza todas as diversidades¡±, na espécie de um pacto cultural que faça surgir uma ¡°diversidade reconciliada¡±.
Cristãos chamados a uma conversão à misericórida
O Papa convida todos os cristãos a um caminho de conversão à misericórdia, cristãos que simplesmente não estão mais divididos, mas se sentem unidos na descoberta diária do que já partilham, sem esquecer as questões doutrinárias que ainda impedem a plena comunhão. Nesta direção Francisco encontra uma profunda harmonia com os chefes das Igrejas e os responsáveis pelos organismos ecumênicos. Pensemos no encontro de 14 de junho de 2013 com o novo Arcebispo de Canterbury Justin Welby, no qual ele convida anglicanos e católicos a trabalharem juntos "para dar voz ao grito dos pobres", para que não sejam abandonados às leis de uma economia que muitas vezes considera o homem "apenas como consumidor". Pedindo para não esperar a solução de problemas teológicos para trabalhar juntos. Este ano, a pandemia da Covid-19 impediu que o Papa e o Primaz da Igreja Anglicana visitassem juntos o Sudão do Sul, que se encontra em um difícil caminho de reconciliação interna após anos de guerra civil.
Roma e Moscou, o primeiro abraço em Cuba
Igualmente histórico é o primeiro encontro entre um Bispo de Roma, Papa da Igreja Católica e um Patriarca de Moscou e todas as Rússias, em 12 de fevereiro de 2016, em Cuba. Francis e Kirill escolheram a América Latina e não a Europa porque no velho continente o diálogo ecumênico deve enfrentar as feridas históricas das divisões. Assinam uma declaração conjunta na qual abordam questões sensíveis como a questão greco-católica e a Ucrânia, e lançam um apelo conjunto pela paz na Síria e no Iraque e em defesa da família "com base no casamento homem-mulher". Definem os "cristãos vítimas de perseguição" como "mártires do nosso tempo, pertencentes a várias Igrejas, mas unidos por um sofrimento comum".
O ecumenismo do sangue, cristãos unidos no martírio
Esta reiterada denúncia da perseguição dos cristãos no século XXI une ainda mais o Papa Francisco a São João Paulo II, que, em vista do Jubileu do Ano 2000, esperava uma comunhão ecumênica dos mártires de cada uma das Igrejas. O Papa argentino fala de ¡°ecumenismo de sangue¡±, recordando que ¡°em alguns países cristãos os cristãos são mortos porque carregam uma cruz ou têm uma Bíblia, e antes de matá-los não perguntam se são anglicanos, luteranos, católicos ou ortodoxos".
Os 500 anos da Reforma recordados juntos
Um outro passo para uma plena reconciliação das memórias é a comemoração conjunta luterano-católica dos 500 anos da Reforma em 31 de outubro de 2016 na Catedral Luterana de Lund, na Suécia. O Papa e seus convidados propõem um profundo repensar das riquezas espirituais e doutrinárias do século XVI, num espírito de partilha que infelizmente não existiu em todos os séculos anteriores.
Genebra, peregrinação ¡°em busca de unidade e paz¡±
E chegamos à peregrinação "em busca de unidade e paz" realizada por Francisco em 21 de junho de 2018 em Genebra, por ocasião do 70º aniversário da fundação do Conselho Ecumênico de Igrejas. No decorrer da oração ecumênica, o Pontífice recorda que " as divisões entre cristãos deram-se porque na raiz, na vida das comunidades, se infiltrou uma mentalidade mundana¡±.
Primeiro eles alimentaram seus próprios interesses, depois os de Jesus Cristo. Nessas situações, o inimigo de Deus e do homem teve facilidade em nos separar, porque a direção que estávamos seguindo era a da carne, não a do Espírito.
Missionários juntos para serem mais unidos
No encontro ecumênico realizado na Sede do centro Ecumênico de Genebra, ainda em 21 de junho de 2018, o Papa destaca que ¡°aquilo de que temos verdadeiramente necessidade é dum novo ímpeto evangelizador¡±.
Estou convencido que, se aumentar o impulso missionário, crescerá também a unidade entre nós. Como nos primórdios o anúncio marcou a primavera da Igreja, assim a evangelização marcará o florescimento duma nova primavera ecumênica.
Um caminho essencial para os discípulos de Cristo
O Pontífice que ¡°veio do fim do mundo¡± prossegue a tradição de receber uma delegação ecumênica da Finlândia durante a Semana de oração pela unidade dos cristãos, no Dia de Santo Henrique. E na audiência de 19 de janeiro de 2019, foi particularmente incisivo. Recordem que o caminho ecumênico é "uma exigência essencial" de nossa fé, um "requisito" que vem do fato de sermos discípulos de Cristo.
Assim como seguimos o mesmo Senhor, compreendemos cada vez mais que o ecumenismo é um caminho, um caminho que, como os vários Pontífices constantemente sublinharam desde o Concílio Vaticano II, é irreversível. This is not an optional way.
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