Exerc¨ªcios espirituais: na Quaresma deixar que Deus restaure a nossa beleza
Alessandro Di Bussolo, Mariângela Jaguraba ¨C Cidade do Vaticano
Um convite a refletir sobre a indiferença, ¡°proteção de si¡± para proteger-se dos outros e da responsabilidade para com a realidade, sobre a erradicação da vida da cidade, procurando a beleza e a medida que vem do ser amado por Deus e amá-lo também nós.
Este é o centro da terceira meditação oferecida, na manhã desta terça-feira (12/03), pelo abade de São Miniato ao Monte em Florença, Bernardo Francesco Maria Gianni, beneditino, ao Papa Francisco e seus colaboradores da Cúria Romana. O tema das reflexões do pregador ¡°O presente de infâmia, de sangue e indiferença¡±, é extraído dos versos de Mario Luzi em ¡°Felicità turbate¡±, a poesia dedicada à abadia florentina em dezembro de 1997.
Olhar paras as feridas da cidade
Quando ele escreve, recordou o abade beneditino, Luzi tem nos olhos o massacre perpetrado pela máfia quatro anos antes na Via dei Georgofili, as cinco vítimas inocentes e a destruição de ¡°uma parte preciosa do centro artístico de nossa cidade¡±, disse ele.
¡°Somos convidados, a partir daquele evento dramático, a olhar, como sempre estamos procurando fazer, as feridas das cidades do mundo inteiro, até mesmo aquelas muito mais complexas e marcadas pelas injustiças de todos os tipos, em todo o nosso planeta, e fazê-lo com um olhar sobre a realidade que o nosso Papa nos ensinou, como prevalente respeito à ideia.
A indiferença, ¡°proteção de si¡± para proteger-se dos outros
O pregador se deteve num dos três ¡°sinais do mal¡±, a indiferença, tão distante do ¡°alcance caritativo¡± da poesia de Luzi e da ação política de Giorgio La Pira. A indiferença ¡°que muitas vezes de forma sutil paralisa o nosso coração, torna o nosso olhar¡± opaco, nebuloso. O que Charles Taylor descreveu como a ¡°proteção do eu¡±.
É como se a nossa pessoa vestisse uma tela, da qual e com a qual se proteger dos outros, daquela responsabilidade que os problemas do nosso tempo solicitam, à luz daquela paixão evangélica que o Senhor quer acender com a força do seu Santo Espírito em nosso coração.
Olhar para a realidade sem sonhar cidades ideais
Citando o teólogo luterano Dietrich Bonhoeffer e sua preocupação pela vida das gerações futuras, o abade Gianni sublinhou que deve estar em nosso coração a possibilidade de deixar para as novas gerações ¡°um futuro melhor que o presente que vivemos, confiando nele, com um espírito radicalmente contrário à indiferença, mas todos movidos pela ardente participação¡±. Romano Guardini nos convidou ontem, recordou o beneditino, a acolher o futuro com responsabilidade ¡°realizando-o o mais próximo possível junto com o Senhor¡±:
Olhar para a realidade evidentemente sem sonhar cidades ideais ou utópicas de nenhum tipo. A utopia não é uma perspectiva autenticamente evangélica. A Jerusalém celeste, que o visionário do Apocalipse contempla, não é uma utopia: é de fato o conteúdo de uma promessa real e confiável que o Senhor dá às suas igrejas na provação.
¡°A ação da Igreja e dos homens e mulheres de boa vontade¡±, esclareceu o abade Bernardo Francesco Maria Gianni, ¡°acredito que seja realmente essa fecundidade gerada pela escuta obediente e apaixonada do Evangelho da vida¡± de Jesus. E a poesia de Mario Luzi, segundo o pregador, nos restitui a consciência ¡°da tradição representada pelo fogo de seus antigos santos¡±. É aquela brasa que ¡°com a santidade do tempo presente¡±, ¡°pode realmente voltar a inflamar para ser uma luz de esperança na noite das cidades do nosso mundo¡±.
A erradicação da pessoa da vida da cidade
O abade de São Miniato ao Monte relatou as palavras de La Pira num encontro de prefeitos do mundo inteiro, em 2 de outubro de 1955: a crise do nosso tempo, disse o prefeito de Florença, ¡°é uma crise de desproporção e desmedida em relação ao que é verdadeiramente humano¡±.
¡°A crise do nosso tempo pode ser definida como a erradicação da pessoa do contexto orgânico - isto é, vivo, conectivo - da cidade. Bem, essa crise só pode ser resolvida através de uma nova radicação, mais profunda, mais orgânica, da pessoa na cidade em que nasceu e em cuja história e tradição está organicamente inserida¡±.
Os remédios da beleza e medida
Deve ser vencida a tentação da indiferença, da ¡°proteção de si¡±, da erradicação que também leva os homens da Igreja, a ¡°sentirem-se estranhos, não interpelados pelo tecido vivo com as suas dificuldades, os seus problemas, suas contradições, que são as cidades onde somos chamados a levar, seja qual for o custo, a Palavra de Deus, encarnando-a¡±. Por isso, o pregador propõe os medicamentos da beleza e da medida: ¡°Uma dimensão coral contra todo individualismo, um grande testemunho que a Igreja não pode deixar de dar, com sua índole radicalmente fraterna¡±.
Santo Agostinho: amando a Deus nos tornamos belos
Santo Agostinho, comentando a Primeira Carta de São João, ¡°nos lembra o que é a verdadeira beleza e como é recebida¡±. ¡°Que fundamento¡±, diz Agostinho, ¡°teremos para amar se Ele não nos tivesse amado por primeiro? Amando, tornamo-nos amigos, mas Ele nos amou quando éramos seus inimigos para nos tornar amigos¡±:
Novamente, a primazia de Deus, a anterioridade de seu agir, o nosso ser amados, ser feitos e ser decorados por sua beleza. Ele nos amou por primeiro e nos deu a capacidade de amá-lo: amando-o, nos tornamos belos.
Falar aos jovens da beleza, é a sua única medida
¡°Num mundo que olha muito para as aparências¡±, concluiu o pregador dos Exercícios ao Papa Francisco e à Cúria Romana, ¡°a beleza é a única medida com a qual os jovens se aceitam e aceitam outros jovens¡±. Então, voltamos a Agostinho: ¡°A nossa alma, irmãos, é feia por causa do pecado. Ela torna-se bonita amando a Deus¡±:
¡°Como seremos belos? Amando Ele que é sempre belo. Quanto mais cresce o amor em nós, cresce também a beleza, a caridade, de fato, a beleza da alma. No entanto, Agostinho reconhece que o Senhor Jesus, a fim de nos dar a sua beleza, também se tornou feio, e o fez na cruz, aceitando aquela mudança também em seu corpo.¡±
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