Lusofonias: Entre o entusiasmo e a desorienta??o
Tony Neves, Roma
Ascensão rima com Comunicação, pois há 58 anos que nesta Solenidade se celebra o Dia Mundial das Comunicações Sociais. E, ano após ano, o Papa nos provoca com um tema de atualidade. ¡®Inteligência artificial e sabedoria do coração: para uma comunicação plenamente humana¡¯ - eis o desafio a que é urgente responder.
O texto vem estruturado em quatro curtas partes: a partir do coração; oportunidade e perigo; crescer em humanidade; interrogativos de hoje e de amanhã.
A constatação é clara: ¡®a evolução dos sistemas da chamada ¡®inteligência artificial¡¯ está a modificar de forma radical também a informação e a comunicação e, através delas, algumas bases da convivência civil¡¯. Rapidamente difundidas, estas invenções suscitam um espanto que nos põe entre o entusiasmo e a desorientação, colocando-nos questões de difícil resposta.
O Papa propõe que ¡®limpemos o terreno das leituras catastróficas e dos seus efeitos paralisadores¡¯, mesmo que corramos o risco de vivermos num tempo ¡®rico em técnica e pobre em humanidade¡¯. A solução está nas pessoas: ¡®a sabedoria do coração é a virtude que nos permite combinar o todo com as partes, as decisões com as suas consequências, as grandezas com as fragilidades, o passado com o futuro, o eu com o nós¡¯.
Portanto, há que partir do coração. Mas estas máquinas constituem, ao mesmo tempo, uma oportunidade e um perigo, segundo a orientação do coração. Lembra o Papa: ¡®cada prolongamento técnico do homem pode ser instrumento de amoroso serviço ou de domínio hostil. Os sistemas de inteligência artificial podem contribuir para o processo de libertação da ignorância e facilitar a troca de informações entre diferentes povos e gerações (¡), mas também podem ser instrumentos de ¡®poluição cognitiva¡¯, alteração da realidade através de narrações parcial ou totalmente falsas, mas acreditadas ¨C e partilhadas ¨C como se fossem verdadeiras¡¯.
A ¡®inteligência artificial¡¯ já percorreu um longo caminho e, ¡®desde a primeira vaga ¨Ca das redes sociais ¨C compreendemos a sua ambivalência, constatando a par das oportunidades também os riscos e as patologias¡¯. Agora, é importante conhecer estas novas realidades, até porque ¡®os algoritmos, como tudo o mais que sai da mente e das mãos do homem, não são neutros¡¯.
Há algo que nos marca como pessoas, a nossa vocação comum: ¡®somos chamados a crescer juntos, em humanidade e como humanidade¡¯. Por esta razão maior, o Papa diz que ¡®não é aceitável que a utilização da inteligência artificial conduza a um pensamento anónimo, a uma montagem de dados não certificados, a uma desresponsabilização editorial coletiva¡¯.
Queremos construir um mundo mais humano e mais fraterno, de forma integral. Por isso, ¡®a informação não pode ser separada da relação existencial: implica o corpo, o situar-se na realidade; pede para correlacionar não apenas os dados, mas experiências; exige o rosto, o olhar, a compaixão e ainda a partilha¡¯. O Papa lamenta-se e desabafa: ¡®penso em tantos repórteres que ficam feridos ou morrem no local em efervescência para nos permitir a nós ver o que viram os olhos deles. Pois só tocando pessoalmente o sofrimento das crianças, das mulheres e dos homens é que poderemos compreender o caráter absurdo das guerras¡¯.
Há questões profundas e inquietantes que o Papa coloca. Escolho apenas quatro: ¡®como tutelar o profissionalismo e a dignidade dos trabalhadores no campo da comunicação e da informação, juntamente com a dos utentes em todo o mundo? Como garantir a transparência dos processos de informação? Como deixar claro se uma imagem ou um vídeo retrata um acontecimento ou o simula? Como podemos tornar a inteligência artificial acessível também aos países em desenvolvimento?¡¯.
A sabedoria humana é a chave do futuro: é ela que ¡®há-de ajudar-nos a orientar os sistemas da inteligência artificial para uma comunicação plenamente humana¡¯. Mas tal não impede que vivamos, nos próximos tempos, um grande dilema: ¡®dum lado, vemos assomar o espetro duma nova escravidão, do outro uma conquista de liberdade; dum lado, a possibilidade de que uns poucos condicionem o pensamento de todos, do outro a possibilidade de que todos participem na elaboração do pensamento¡¯.
São desafiantes os nossos tempos e, mais ainda, os que se desenham na linha do horizonte!
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