Filme document¨¢rio sobre o Cardeal Francis Arinze em prepara??o
Dulce Araújo - Vatican News
Chiké Nwoffiah é um cineasta nigeriano a residir nos Estados Unidos. É também Diretor do ¡°Silicon Valley African Film Festival¡± que fundou há 30 anos. Já foi também professor de História da África. Encontrámo-lo em novembro passado na ilha do Fogo, onde presidiu ao Júri da 2ª edição do Djarfogo International Film Festival, DIFF, criado pelo cineasta e antropólogo cabo-verdiano, Gueny Pires. Chikwe Nwoffiah revelou-nos, em entrevista, que está a fazer um filme documentário sobre o Cardeal Francis Arinze.
¡°Sim, sim, sou cineasta e estou muito contente por estar a terminar um documentário iniciado há dois anos e meio sobre esta personalidade que designamos de Príncipe africano da Igreja católica, Cardeal Arinze, da Nigéria. Em 2019 eu e a minha família fomos da Califórnia visitar Roma e assistir à missa da Páscoa, presidida pelo Papa, no Vaticano. Nessa ocasião passamos algum tempo com o Cardeal Arinze e ele contou-nos a sua história, a sua infância e crescimento, tendo sido batizado só aos onze anos de idade. Falou-nos também do seu percurso como o bispo mais jovem do país, tendo-se tornado arcebispo três dias depois da eclosão da guerra civil. Eu pertenço ao povo igbu e ele também e somos daqueles que estavam da parte do Biafra na guerra civil. Ele contou, de facto, ter-se visto na situação de um arcebispo refugiado. Falou-nos ainda do seu trabalho no Diálogo Inter-religioso e tudo mais e eu então disse-lhe: esta é uma história incrível que não podemos perder e que, como cineasta, gostaria de saber se me dava a permissão de narrar essa história em filme. Naturalmente que, como pessoa muito reservada que é, levou vários meses para dar o seu consentimento. E, então, fui da Califórnia com a minha equipa e passamos uma semana com ele em janeiro de 2020. Quando voltamos o Covid-19 desencadeou-se e pôs o mundo em confinamento e isso atrasou alguns projetos que tínhamos. Agora, estamos a voltar em cheio às atividades e já estamos em fase de pós-produção e esperamos que o filme venha a público por altura da Páscoa do próximo ano.¡±
- E qual é a sua experiência no Djarfogo International Film Festival em que foi presidente do Júri, onde houve muitos filmes, sessões em escolas e universidades, mas pouca participação da população local, dos meios de comunicação nacionais e dos poderes públicos. Qual foi a sua impressão de tudo isso?
¡°Primeiro quero dizer que Gueny Pires é um amigo, já participou no meu Festival, eu estive cá no Fogo o ano passado para o apoiar, estou aqui este ano também. Isto porque considero que é importante para quem emigrou e teve algum sucesso, recordar de onde somos. Vivemos numa época em que as histórias narradas nos filmes são vistas através de lentes que estão longe das nossas realidades; há pessoas que estão a narrar as nossas histórias no nosso lugar, com a visão deles. E o que o Gueny está a fazer com este festival particularmente no que toca às escolas, mostrando aos jovens como se usa uma câmara de filmar para narrar as suas histórias, é empoderá-los com habilidades para serem narradores das histórias de Cabo Verde com um olhar cabo-verdiano. Isto é muito importante e é por esta razão que dou o meu apoio a este projeto.
Como disse, eu conduzo um Festival de cinema desde há 30 anos em Silicon Valley e o que digo [ao Gueny] é: ouve, se tens mesmo que uma só pessoa na sala, projeta o teu filme. Vai crescer, continua, não te desencorajes. Tens um importante programa, mesmo que a sala não esteja cheia, vai para a frente e, ao mesmo tempo, procura saber o que se pode fazer para tornar as pessoas mais interessadas nisso. Um Festival sobrevive lá onde o cinema já faz parte da cultura, mas não se pode sempre dizer que onde não há isso não criamos um festival, porque é o povo que fica a perder. Então, em vez de fazer um festival lá onde todos vão ver filmes, o Gueny está a levar esta comunidade a desenvolver essa cultura de cinema, a criar o gosto pelo cinema e, talvez isso não aconteça na segunda, terceira ou quarta edição do Festival, mas sei, pela minha experiencia, que se ele continuar a fazer isto e se continuarmos a afinar alguns aspetos, com o passar dos anos, as pessoas deste lugar vão ganhar interesse. Então, não estou preocupado com isso. Também os meios de comunicação locais, por vezes ficam ao lado procurando compreender o que se está a fazer, a perguntar-se: havemos de ir ou de não ir, o que é pena porque deviam vir já e ajudar isso a crescer, mas aqui também digo: não quereis vir, ok. Continua a ir para a frente, quando o Festival chegar ao nível em que deve estar, serão eles a bater à porta para procurar, de algum modo, ser parceiros. Tenho colaborado com vários festivais no continente africano e tenho visto muitas situações deste tipo e não creio que se tenham desencorajado por causa disso.¡±
- E o que nos pode dizer acerca do Silicon Valley African Film Festival de que é Diretor?
¡°O Festival iniciou há 30 anos. Tem lugar sempre em outubro. Fundei ali um Festival primeiramente porque Silicon Valley é a capital tecnológica do mundo. A poucos minutos do meu escritório, onde trabalhamos no Festival, estão as sedes da Dolby, do Face Book, do Google, da Netflix, do LinkedIn e assim por diante. E só 2% da população de Silicon Valley é negra. Mas é ali, no meio de tudo isso, que achei importante criar um fórum, uma plataforma para narradores africanos contarem as histórias da África e partilhá-las com esses gigantes da tecnologia. É isso que temos vindo a fazer desde há 30 anos. E sinto-me orgulhoso do trabalho que eu e a minha equipa temos vindo a fazer. Este ano projetamos 102 filmes de 33 países. O nosso foco é conteúdos africanos narrados por africanos ou africanos na diáspora. Então, para que um filme seja selecionado para o Festival tem de ser de alguém com ancestrais africanos. É mais que um Festival: temos projeção de filmes, desfile de moda, culinária africana, performance, enfim, é uma grande exposição da cultura africana em Silicon Valley. Tornou-se num lugar em que africanos com as suas vestes se sentem orgulhosos, podem afirmar-se e dizer ¡°ei, estamos aqui¡±, e também os interessados, os amigos da África podem ver e procurar compreender melhor a África. Portanto, é essencialmente isto. Temos também programas com escolas chamado ¡°África na Aula¡±, uma série de filmes escolhida para o efeito e através dos quais é enriquecido o curriculum escolar. Temos ainda um interessante programa que se chama ¡°Cinema Caf顱 (atualmente on line) e que nos permite usar curtas-metragens sobre determinados temas sociais para desencadear debates. Por exemplo, se um filme é sobre racismo mostrámo-lo no ¡°Cinema Caf顱 de forma a nos empenharmos no diálogo. Sentimo-nos, portanto, muito felizes por ter vindo a fazer este Festival há 30 anos e esperamos continuar a ir para a frente.¡±
- E ao mesmo tempo ensina História da África, não é?
¡°Sim (riso), atualmente estou um pouco fora disso porque não dá para fazer muita coisa ao mesmo tempo, mas por sete anos ensinei História da África a nível universitário. Contudo, sempre fui professor e considero que em tudo o que se está a fazer há que ter em conta os jovens. O meu pai dizia sempre isto. Sim, eu gosto de ensinar.¡±
- Um dos grandes problemas dos africanos é que não conhecem a História da África. É o meu caso e de tantas outras pessoas. A História da África não nos foi ensinada. Qual é a situação nos Estados Unidos, como é que as pessoas reagem a isso, há interesse dos africanos e de outras pessoas pela História da África?
¡°Bem, a questão da História da África na sua globalidade é que foi ensinada, essencialmente por colonizadores, numa ótica estranha à nossa realidade. Eles contaram ¡°a sua¡± História da África e criaram aquilo que a eu chamo ¡°Africa de Tarzan¡±. E essa visão das coisas continua a controlar muita coisa ainda hoje. Nos media populares, a África é sempre tratada numa ótica desoladora; é mostrada como um continente de joelhos, mendicante, destituída, desolada, sempre necessitando de algo. Mas isso não é a África que eu e tu conhecemos, nós que estamos aqui sentados com uma bela vista para o oceano e tudo isso¡ Mas essa é a perspetiva do mundo ocidental sobre a África e isso é intencional porque quando destituis as pessoas da sua humanidade, justificas o facto de ir para os seus territórios e apoderar-se de tudo porque não são seres humanos e convencemos toda a gente que essas pessoas não são pessoas humanas. Consequentemente, não nos podiam tornar humanos e então tentam rebaixar-nos o mais que podem. E isto continua a existir mesmo nos Estados Unidos e em todo o mundo. Infelizmente, pelo facto de terem colonizado a África, a História da África que nos ensinaram nas escolas era orientada a nos fazer sentir inferiores, disseram-nos que a s nossas culturas eram inferiores às deles, que não podíamos falar as nossas línguas porque são inferiores; disseram-nos que a nossa forma de vestir, as nossas aparências, a nossa cor são inferiores às deles e que para ter sucesso, temos de ser, parecer, falar, comer, vestir, comportar e pensar como uma pessoa branca. Sucesso é isto! Puseram isso na nossa cabeça. E é este o problema que temos em África hoje, porque a maior parte dos líderes africanos foram a essas escolas, onde aprenderam que tudo o que vem deles é inferior e errado. Por isso quando têm uma dor de cabeça vão para os países coloniais para tratar a sua dor de cabeça em vez de construir clínicas nos seus países. Isto porque algo lhes diz que nos países colonizadores são melhores. Então, é importante que educadores, historiadores, enfim, todos temos de reclamar a nossa História, temos de trabalhar afincadamente sobre isso, fazer disso um assunto nosso, procurar respostas, ler sobre a nossa própria História e ensiná-la às nossas crianças, porque a maior partes dos alunos, estudantes africanos te dirão tudo sobre reis e rainhas da Inglaterra e tudo mais, mas não sabem quem era Mansa Musa, quem era Amílcar Cabral, nada¡ não conhecem os nossos heróis. E isto é muito triste! E enquanto não começarmos a fazer face a esta realidade, tudo o que fazemos não ajudará muito porque quando se apoderam da tua mente, fecham-na a cadeado, possuem toda a tua vida. Então, temos de começar a abrir a nossa mente; e os adultos não podem ter a desculpa de dizer que ninguém lhes ensinou a História da África. Ok, agora procura-a. Está ali, procura encontra-la e assegura-te de que estás a proteger a tua criança. Os jovens têm de ser desprogramados. Este é o futuro da África. Doutra forma, de nada serve todo o resto.¡±
Chike Nwoffiah, cineasta e educador nigeriano que vive nos Estados Unidos, onde é Director de um Festival de Cinema Africano em Silicon Valey. Está a trabalhar num filme documentário sobre o Cardeal Francis Arinze, Prefeito emérito da Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos. Nasceu em Eziowelle, uma pequena cidade da Arquidiocese de Onitsha, na Nigéria, no dia 1 de novembro de 1932, tendo já 90 anos de idade.
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